sábado, 18 de fevereiro de 2012

"Sai uma preta bem gelada para o Silva!..."

Sempre ouvi dizer que o gelo é a terapêutica ideal para cuidar as maleitas do esqueleto. Dói? “Põe gelo” – Diria o meu Pai. Não está a correr como esperado? “Bebe um whisky que isso passa!” – Aconselharia o Serra. Infelizmente, nem o gelo todo do lago Wiesensee (a 80Km de Frankfurt, onde estive a semana passada) chegou para debelar esta maldita tendinite.
Treinei, como previra, todos os dias no ginásio do hotel, fazendo sobretudo reforço muscular e aparelhos estáticos. No final de cada sessão, abria a porta da rua e colocava um pedaço de neve no joelho inflamado. Um minuto era o que bastava para congelar literalmente a zona afetada e não deixar que os -16C que se faziam sentir pudessem por o dente a bater. Onde está a cerveja? "Sai uma preta bem gelada para o Silva!..." Um luxo, pensei eu, longe de imaginar o perigo que corria. E assim, logo à primeira tentativa, consegui arrancar literalmente um bocado de pele, sem nada sentir. Perigoso, o gelo. Muito perigoso. Puro ou com whisky, acaba sempre o desfecho em desfeita!
De regresso a Portugal, ainda fiz uma sessão fisioterapêutica (e um curso fantástico de massagem a dois, mas isso é outra história) com os meus já conhecidos laser, ultrassons e eletroterapia na Fisiotorres. A Ana bem que tentou retirar alguma da frustração que vira em mim, mas a tareia que me deu na massagem fez-me claramente antever uma recuperação demorada e um forte sinal de reprovação em tentar correr fosse o que fosse, ao mínimo sinal de dor. Assim seriam os tempos mais próximos e assim passei a ver Sevilha por um canudo.
Mas tristezas não pagam dívidas e as maratonas não fogem… haverão seguramente muitas outras oportunidades para superar este desafio!
Decidido que fiquei em querer manter a boa forma para a qual tanto trabalhara, hoje foi dia de regresso à bicicleta de estrada. Acordei cedo e vesti-me a rigor para o frio, aproveitando para estrear uma jersey nova que mandei vir da Rapha. Em seguida, liguei o Polar. No visor, apareceu: Sevilha 42K – Tomorrow. Desde que programei a data da Maratona há mais de dois meses atrás, que todos os dias o Polar me dá a contagem decrescente, em jeito de motivação. Amanhã seria o meu grande dia. Todavia no lo será.
Imagino que a esta hora a equipa do Mundo da Corrida esteja em plena viagem, quiçá já no Algarve. Concentro-me novamente no Polar, converto-o para modo de ciclismo e coloco-o no guiador da bicicleta. Olho para a minha Destinée (nome que dei à bicicleta de estrada) e constato como é mesmo bela, o raio da fininha. Lubrifico a corrente, verifico a pressão dos pneus, e saio porta fora.
Já na estrada, dou as primeiras pedaladas. Adoro sentir os cleats encaixarem-se nos pedais, ligando homem e máquina num corpo só qual avatar e seu dragão voador. O carbono é altamente reativo e transforma qualquer impulso do nosso corpo em potência na estrada, a qual devolve na mesma moeda as dificuldades do percurso.
Hoje a volta foi de recuperação, para rolar as pernas, pelo que decidi ir apenas à Malveira da Serra e voltar a Oeiras. Tendo feito o percurso praticamente sozinho, a determinada altura senti que rebocava um jovem iniciado na modalidade, a julgar pela bicicleta novinha em folha, ainda com os plásticos a cobrirem as fitas do guiador (?!). Foi assim durante toda a estrada do Guincho, e assim ficou com a subida à Malveira. Já estava eu em plena descida, ainda vinha o rapaz com uns bons 200 metros de subida pela frente. Depois de dois meses praticamente só a treinar para a maratona, afinal ainda consigo subir decentemente uma serra, pensei eu com satisfação.
Já em S. João, fui absorvido por um pelotão de cerca de 20 ciclistas, em direção à Expo. O ritmo era vivo e grupo compacto. Entusiasmado que estava com o regresso à estrada, aproveitei a boleia até Carcavelos, onde saí em direção a casa. Por esta altura, 1h45min após ter iniciado o percurso, comecei a sentir o joelho a queixar-se. Estava na hora de dar o treino por terminado.
Que bem que me soube, e que bom que é voltar a pedalar a Destinée. Até recuperar totalmente, vai ser no ciclismo que continuarei a “correr”. E muito gelo, claro!

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

“Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay”

6 de Janeiro de 2012. Faltam hoje precisamente 13 dias para a Maratona de Sevilha. Não tendo por hábito agarrar-me a superstições, a verdade é esta: depois do estiramento e da inconveniente gripe, eis que me aparece uma dor na face externa do joelho esquerdo. Estou há 4 dias sem conseguir correr.
Fazendo uma retrospetiva, a semana passada até que começou bem, é bom dizer. 2ªF descansei dos 29Km da véspera; 3ªF corri 60’ intercalados com fartlek de 8x 1’ rápido/ 1’ lento e na 4ªF, um treino de 10Km a 5’/km. Até aqui, tudo normal.
Acontece que nesse dia, depois do treino, decidi ir a pé a um jantar profissional agendado para um restaurante relativamente próximo de casa. O regresso, suposta leve caminhada de relaxamento, acabou por converter-se numa penosa luta contra os sapatos que mordiam os pés. No dia seguinte, percebi que ao tentar proteger-me das bolhas, terei forçado inadvertidamente o joelho esquerdo a um movimento para além do normal já que deu sinais de estar algo dorido. Não dei muita importância e à noite fui fazer o treino habitual.
Com o frio que estava, pensei sinceramente que a moínha que sentia no joelho fosse passar após o aquecimento. Continuei a correr. O ritmo estava rápido, em torno dos 4’30/ Km. Sentia-me be; em forma. Mas a moinha ao invés de passar, foi aumentando cada vez mais. Quando dei por mim, estava na Torre de Belém e ainda tinha 40’ de regresso a casa pela frente. O resto foi um verdadeiro calvário. Depois de duas ou três paragens, terminei a coxear e com a perfeita noção que tinha estragado tudo.
Desde então, tenho feito anti-inflamatório e gelo. No Domingo, dediquei-me a exercícios de reforço muscular. Hoje tentei retomar a corrida, em vão. As dores voltaram e decorridos apenas 900m decidi interromper o treino.
Não sei o que acontecerá daqui para a frente. Não sei de esta mazela desaparecerá nas próximas duas semanas. Não sei se irei conseguir retomar os treinos até à prova. Para ser franco, não sei se estarei em condições sequer de participar e de me aventurar a correr os 42,195 Km.
Vem-me à ideia o que poderá estar a sentir o Nelson Évora com a gravíssima lesão que o impede de ir aos Jogos Olímpicos e o impacto que isso terá na sua carreira profissional. Penso na decisão agora anunciada de terem retirado o título do Tour de France ao Alberto Contador, e como ele lidará com os próximos dois anos de afastamento de todas as provas oficiais. Não sou atleta profissional, mas a motivação e empenho que me levam a traçar estes desafios na minha vida acabam por expor-me emocionalmente a todos os percalços e acidentes de percurso com que me vou deparando. Tento relativizar as interrogações e não dar muita importância ao sucedido.
Esta semana, por motivos profissionais, vou passar três dias numa estância a 80 Km de Frankfurt. O prognóstico meteorológico não é animador: máxima -8ºC; mínima -16ºC. Não quero ser pessimista, mas acho que correr no bosque vai ter de ficar para outros carnavais… O que vale é que o Hotel tem ginásio. Vou aproveitar para fazer mais reforço muscular, bicicleta e quiçá alguma corrida na passadeira.
Como diria o outro: “Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay”.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Manhã de Domingo

Depois de 3 dias consecutivos sem correr, a exorcizar do meu esqueleto uma maldita "gripe", febre e o diabo a quatro - cruz credo, malapata dum raio (!), ontem foi dia de regresso aos treinos. Ou melhor dizendo, a uma quase resignada tentativa de manutenção da forma que possa ter ainda conquistado nos vários meses de preparação que já levo nas pernas.
Tropeçar em lesões, estados gripais, responsabilidades profissionais/ familiares, a menos de um mês de uma maratona, justamente naquela altura em que devemos estar totalmente disponíveis para levar o corpo a absorver toda uma carga de treino, é, no mínimo, frustrante. O que não correr até aqui, já não vou conseguir correr até à prova. Isto em termos de volume de treino é claro. É que mais uma semana e começa o período de descompressão, com diminuição da quilometragem e passagem para séries curtas e rápidas - justamente o que eu deveria, depois de uma lesão, evitar fazer.
Vai daí, ontem fiz um primeiro teste de uma hora. Até que correu bem, pese embora o estado gripal ainda latente e tosse que teima em não desaparecer. Ainda assim, fiz 12Km.
Hoje, Domingo, tinha previsto 32Km no plano original. Estava frio. Demasiado frio, para quem ainda anda a ben-u-rons e carrega uma maldita tosse. Porém, a vontade falou mais alto e lá me equipei para a jornada que tinha pela frente. Tirei a first layer da gaveta do snowboard, calcei as luvas novas que me ofereci nos saldos do El Corte Inglês, e coloquei o lenço que a minha querida M. fez questão em partilhar. Para enganar o jejum e aquecer o espirito, tomei um duche de água quente, fiz um chá verde com mel, comi um figo com amêndoas e uma barra energética. Estava pronto para sair.
Àquela hora, a Estação Agronómica Nacional em Oeiras transparecia toda uma serenidade outrora vivida pelo nosso Marquês de Pombal. É um dos motivos por que gosto de sair cedo. As ruas ainda desertas abrem lugar à contemplação e põem a imaginação a funcionar.
20 minutos depois, estava já em Paço d'Arcos, onde me esperava o Ricardo Diez, em pleno aquecimento. E lá fomos nós, em direcção a Cascais, a falar das agruras da vida de um corredor e das muitas recompensas e experiências únicas que só nós sentimos ao superar tamanhos desafios. Uma manhã muito bem passada.
Resultado: Um total de 29Km, 15 dos quais a 5'15''/Km e os restantes entre os 4'40'' e os 4'50''/Km. Ao Km 28, tive uma quebra súbita de energia e pensei que o figo e a barra já se tinham evaporado e o chá, apesar de importante antioxidante, não puxa carroça. Como também não ajudou muito o bacalhau e vinho tinto da véspera (mas que bom que estava...).
O Balanço foi positivo e devo conseguir retomar os treinos em pleno já esta semana. Assim consiga parar de tossir e voltar a respirar convenientemente (!).

domingo, 22 de janeiro de 2012

Amanhã é um novo dia

Executar uma determinada tarefa, de preferência repetitiva e mobilizadora do meu corpo, digamos locomotor, sempre constituiu para mim uma excelente forma de libertar a mente e criar espaço à reflexão. É como se essa actividade física – passear o cão, lavar a loiça, correr ou andar de bicicleta - gerasse uma espécie de corrente eléctrica onde o pensamento a cavalo nos electrões, apanhasse boleia para todo um conjunto de elaborações em torno de um determinado desígnio ou tema que exigisse a atenção devida.
Posso dizer-vos , com indubitável certeza, que muitas resoluções e decisões que tomei na vida, clarificaram-se nestes referidos momentos de introspecção. Nos dias difíceis que atravessamos a reboque deste país sem rumo, todos nós, uns mais que outros, ao mesmo tempo ou a velocidades diferentes, acabamos mais tarde ou mais cedo por nos confrontarmos perante o abismo, com adversidades que nos poderão fazer cair em perdição.
Todos conhecemos a famosa abertura de Tolstoy em Anna Karenina, “As famílias felizes são parecidas entre si; as infelizes são infelizes cada uma à sua maneira”. Ora, transpondo para cada um de nós indivíduos, eu diria que é justamente perante o abismo, perante a vertigem ou a salvação, que nós encontramos o nosso carácter – e é justamente esse carácter que distinguirá aqueles que prosseguem rectos o seu caminho, daqueles que caem no abismo.
O Desporto, o ciclismo e a corrida em particular, as provações que passei para ultrapassar lesões e momentos pessoais e profissionais menos bons, sempre constituíram para mim uma força interior para continuar o meu caminho. Uma segurança para encaixar os golpes e ultrapassar os obstáculos com que me deparo vida fora.
A todos vocês que me rodeiam, só posso exortar-vos a fazerem o mesmo e nunca baixarem os braços perante as adversidades. A vida é curta demais para deixarmos que fuja entre dedos. Cabe-nos a nós traçarmos o nosso próprio caminho e vivermos a vida em toda a sua plenitude. É assim que procuro vivê-la, e é junto de pessoas que partilham desta mesma atitude perante a vida que quero continuar o meu caminho.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Outch... chiça, penico!

Hoje, ao quinto dia de repouso, já sem dores, havia chegado o momento de dar o corpo ao manifesto. Que é como quem diz, de meterem as mãos na pernoca inflamada. Hoje, foi dia de visita à Fisiotorres.
Afinal, o bindinha do ligamento lateral (sim, que “colateral” é ‘brazleiro’, aprendi hoje) interno, portou-se que nem um herói. O dito cujo "estirado" foi mesmo o grandalhão que liga o adutor e a coxa ao joelho, suposto fortalhaço que virou franganote. Mas isso agora não interessa nada. O importante é que a recuperação está em marcha, o que é bom de ver.
Após uma breve massagem de aquecimento, enquanto punha a conversa em dia... Aiiiiii uuuuiiiii isssshhhh oooutch oohhh ui uiii ai aiii, bate a mão, vira o pé, morde o dente, agarrrra o telélé – que sorte teve em não se despedaçar contra a parede. 
Acto contínuo à tareia de entrada , já com fibras e tendões realinhados, demos continuidade à ementa do dia: laser, radioterapia e electroterapia seguida de eletroterapia com voltaren. Para sobremesa,  massagem com gelo.
Custa? Podem crer que custa, mas a equipa da Fisiotorres não brinca em serviço. Bem-hajam!
A verdade é que saí de lá regenerado e pronto para continuar a recuperação já com introdução de corrida a partir de amanhã. A saber: trote, seguido de alongamentos e massagem com gelo. Durante a noite, nova aplicação de Transact. Chiça, penico!

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Relaxa que isso passa...


O aspirante a maratonista lesionou-se quarta-feira passada enquanto efectuava exercícios de flexibilidade em noite muito fria.

O gabinete médico-desportivo prognosticou hoje, após realização pelo próprio atleta de exames complementares de diagnóstico à distância, um provável estiramento do ligamento colateral interno do joelho esquerdo, o que irá obrigar a uma paragem da sua preparação para a maratona de Sevilha.

A fisioterapeuta do atleta aponta para um tempo de recuperação não superior a uma semana, período em que deverá efectuar descanso, massagem com gelo e aplicação de TransAct (pensos impregnados com flurbiprofeno 40mg).

A próxima reavaliação ocorrerá dentro de 48h e determinará a necessidade de se proceder a tratamento fisioterapeutico complementar.

Fonte próxima do atleta assegura que este se encontra resignado mas confiante na recuperação, e tem instruções explicitas do seu treinador para relaxar e não pensar muito no assunto, pelo que deverá aproveitar ainda mais este período para... namorar (!)

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

The Empty Quarter



Em tempos vi na National Geographic a fotografia de uma caravana de nómadas a atravessar o deserto, onde o destaque era dado à sua sombra projectada nas dunas. A imagem despertava um misto de misticismo e ficção, e transportou-me para as areias das Arábias do Empty Quarter de T.E. Lawrence, naquela que é, para muitos de nós, a viagem de uma vida lá para terras do Preste João.

Mais perto, numa outra austeridade - a da manhã fria de inverno, com o sol raso a tardar a subir, o treino de ciclismo de Sábado passado recordou-me novamente que existe algo de mágico no simples ato de progredir entre dois pontos. Na cadência certa, e com o vento gelado a soprar do Guincho, naqueles breves minutos perdidos na imensidão do espaço e do tempo, a minha mente fluiu entre a roda do Miguel e os nossos alter-egos que teimavam em não descolar.   

Na semana que passou, mágica por sinal, atingi mais dois recordes pessoais ao correr um acumulado de 107 Km em 8 dias (a que se somam 60 de ciclismo) dos quais 29Km foram realizados ontem em 2h23m.

Em Junho de 2011 tracei para mim próprio o objectivo de correr a distância mítica. Faltam hoje precisamente 40 dias para a minha estreia, na Maratona Los Palácios, em Sevilha.